04/10/2015

O DIA DAS ELEIÇÕES

  O Sr. Joãozinho das Perdizes chega ao local de voto, com os seus homens:

 A barba por fazer, as melenas despenteadas, o lenço do pescoço solto, sem botões o colarinho da camisa, com as mãos metidas no cós das ceroulas, o chicote no bolso da jaqueta de peles, as botas enlameadas até o joelho, a ponta do cigarro ao canto da boca, o palito atrás da orelha, o chapéu sobre o óccipit, dois galgos adiante se si, e o inseparável Cosme quase «a latere», entrou no adro com ares triunfantes, sorrindo e piscando os olhos para o seus amigos e partidários, como para lhes fazer notar a numerosa procissão que o seguia a docilidade dos membros dela.
   Atrás vinham eleitores de Pinchões, velhos e moços, ricos e pobres, mas todos com um olhar tímido e estúpido, todos com movimentos enleados, todos com os olhos no caudilho, para saber o que deviam fazer; se ele parava a cumprimentar um amigo, paravam todos com ele, a direcção que tomava, tomavam-na todos a um tempo; apressavam ou demoravam o passo, segundo a velocidade que ele dava aos seus; se ria sorriam; se praguejava, tudo ficava sério. O cortejo parou à porta da igreja.
 O morgado passou a revista à sua tropa, à qual deu instruções.

 Os homens, com os cabelos para diante dos olhos, os braços estendidos e a cabeça baixa, não ousavam fazer um movimento e conservaram-se enfileirados até nova ordem do Sr. Joãozinho.

  Depois de várias peripécias eleitorais, como Brasileiro já a contar com a vitória:

 Adiantava-se lentamente, pálido, curvado, acabrunhado como nunca, o velho herbanário, a quem o braço de Augusto servia de apoio.
  Dir-se-ia um cadáver ressuscitado do túmulo.

 Com as faces pálidas, o olhar amortecido, os passos incertos, o herbanário adiantava-se, e trazia já de longe o braço estendido, segurando a lista que vinha lançar na urna.
  (...)

   O morgado das Perdizes, deveras afeiçoado ao herbanário, não teve

  O morgado das Perdizes, deveras afeiçoado ao herbanário, não teve mão em si, ao vê-lo assim doente e enfraquecido, que lhe não viesse ao encontro, dizendo comovido:
   - Ó tio Vicente! Pois nesse estado?!…
   (...)

  - Cala-te. Deixa-me passar, que quero, como homem desta terra, protestar contra a iniquidade que tu e os teus praticam hoje, apedrejando aquele a quem deveis tudo. Vendei-vos como cães, e ficai-vos com esse remorso; eu não o quero para mim.

  E o dia acabou em festa, com bombos e com a vitória de...



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